O caso da Escola William Henderson – Boston, EUA

Introdução

O projeto DIVERSA almeja provocar reflexões sobre experiências desenvolvidas em diferentes contextos socioculturais. Para tanto, convida pesquisadores de outros países a colaborarem por meio da investigação de práticas pedagógicas reconhecidas como inclusivas. Não raro, o próprio conceito de educação inclusiva será entendido e praticado de modo peculiar. Essa tensão conceitual é parte da riqueza de nosso acervo de casos e revela a profundidade de análise necessária ao estudo do tema.

A Escola de Inclusão Henderson se tornou inclusiva há mais de duas décadas e foi reconhecida como referência nos Estados Unidos. Ao longo dos anos, os professores e líderes da Escola Henderson desenvolveram um modelo de educação inclusiva que provou fornecer um ensino igualitário a estudantes com diferentes habilidades.

Este estudo de caso estabeleceu como professores da Escola Henderson efetivamente implementaram a educação inclusiva delineando a estrutura da escola, pedagogia e currículo, uso de tecnologia e colaboração entre professores e especialistas. A escola enfrentou o desafio de como desenvolver uma política disciplinar que permitisse que os estudantes se expressassem, de forma a reconhecerem suas diferentes necessidades, enquanto minimizavam comportamentos destrutivos ou impróprios.

Um dia na vida

Às 09h05 de uma manhã ensolarada de junho, a Srta. Bennett, professora do quarto ano da Escola de Inclusão Henderson, parou em frente a sua sala para começar o dia. Seus estudantes de nove a dez anos reuniam, dentro da sala, todas as classes sociais: alguns vinham de famílias de classe alta, outros de classe média, além de uns com famílias interessadas e outros com pais aparentemente ausentes ou desinteressados.

Seis dos 22 estudantes da classe da Srta. Bennett tinham deficiências diagnosticadas, quatro estudantes eram Aprendizes da Língua Inglesa (ALI) e dois tinham altas habilidades, exibindo destreza de literatura de 8º a 9º ano. Essa classe altamente diversificada demandava que a Srta. Bennett diferenciasse suas instruções e modificasse o conteúdo para beneficiar todos os estudantes igualmente.

A Srta. Bennett começou seu dia escrevendo a agenda diária na lousa e preparando os laptops para o treino matutino de digitação. “É absolutamente essencial que nós comecemos todos os dias iguais para que os estudantes saibam o que esperar quando eles entram por aquela porta. A forma como começa se transfere para o resto do dia, então muita energia é usada pela manhã”, ela explicou.

Os estudantes chegavam toda manhã e praticavam suas habilidades de digitação pelos primeiros vinte minutos. Sem serem solicitados ou direcionados, a maioria deles pegava seu laptop de um carrinho, fazia login e começava. A Srta. Bennett e sua parceira de ensino, Srta. Foster, designaram vinte minutos pela manhã para tal exercício porque os alunos com uma gama diversificada de necessidades dependiam intensamente de tecnologia, o que requeria conhecimento do uso de um teclado.

Ter rotinas e procedimentos estruturados ao longo do dia ajudavam a Srta. Bennett e a Srta. Foster a lidar melhor com as necessidades imprevistas de estudantes. O trabalho da manhã tinha que ser algo que todos os alunos pudessem concluir confortavelmente, para que não desencadeasse reações em alguns estudantes. Por exemplo, alguns alunos com deficiência de aprendizado poderiam ficar muito agitados, desencorajados e talvez desistissem se lhes fosse solicitada uma tarefa que eles não conseguissem concluir com sucesso.

A Srta. Bennett e a Srta. Foster também utilizavam esse tempo pela manhã para checar quais estudantes precisavam de encorajamento para começar o dia de forma positiva. Elas forneciam uma prévia das atividades para garantir que os educandos que precisassem ter uma percepção de estrutura fossem capazes de planejar o dia à frente.

Em uma manhã em particular, Jonny, um estudante com problemas sociais e de comportamento, entrou na sala, jogou sua mochila no chão, amarrou o capuz apertado sobre a cabeça e abriu caminho batendo os pés até sua cadeira. A Srta. Bennett foi até ele e o abordou: “Como estamos hoje? Por que o capuz está na cabeça? Hoje será um ótimo dia. Como eu posso te ajudar a se preparar para que seja um bom dia? Alguma coisa aconteceu em casa sobre a qual você queira conversar? Esse é um novo dia, um novo começo. Vamos torná-lo bom.”

Jonny pediu para sair para o corredor com a Srta. Bennett para desabafar um pouco sobre sua frustração e receber atenção pessoal. Depois de conversar, ele entrou novamente na classe com um humor notavelmente melhor. Pegou sua mochila e rapidamente começou o trabalho da manhã.

Tim, um aluno com Síndrome de Asperger, não queria ir à escola. Quando o sinal soou depois do intervalo matutino para brincar, ele decidiu permanecer no pátio. Como isso é um problema na maioria das manhãs, um preceito foi desenvolvido de acordo com o qual Tim pôde optar por ir para a diretoria para relaxar, enquanto os outros alunos faziam os trabalhos da manhã. Ele ficou vinte minutos lá e, depois de passar um tempo com a diretora, com quem tinha um bom relacionamento, se sentiu preparado para regressar à classe. Ele não foi o único estudante que levou um pouco mais de tempo para conseguir retornar à sala de aula; naquele dia, em particular, vários alunos que não tomaram café da manhã em casa realizaram primeiro essa refeição, iniciando a digitação cerca de dez minutos depois do resto da sala.

Depois que os vinte minutos de digitação acabaram, a classe se juntou para a roda comunitária da manhã. Na roda, eles conversaram sobre a agenda do dia, esclareceram as expectativas e finalizaram repetindo os anúncios gerais da escola. Jonny era o aluno do dia e, portanto, o facilitador da roda da manhã. Essa tradição começou para proporcionar aos estudantes uma oportunidade individual de trabalhar sua linguagem oral e habilidades de comunicação. Jonny leu o lema da classe, “o fracasso escolar não é uma opção¹” e falou sobre o código de conduta da classe. O código de conduta era explicitado e reiterado diariamente para que os estudantes soubessem que é esperado sucesso deles, e que o sucesso pode parecer diferente para diferentes pessoas. A classe agora já tinha se instalado e estava pronta para começar um dia bem sucedido na escola.

História da educação especial e a Escola Henderson

Desde a primavera de 1989, a Henderson tinha desenvolvido uma estratégia de inclusão surpreendentemente simples e altamente bem sucedida, que se apoiava na crença de que todas as crianças, com deficiências ou não, se beneficiam do ensino conjunto. Uma escola inclusiva significa que estudantes com deficiências aprendem através da educação geral tão bem quanto alunos dotados e talentosos.

Nos Estados Unidos, hoje, a inclusão tem cada vez mais se tornado a prática padrão. No entanto, nem sempre foi assim.

O ensino para pessoas com deficiência nos Estados Unidos tinha melhorado nos últimos trinta anos. Na década de 1970, a institucionalização, prática na qual as pessoas com deficiências eram forçadas a viver em abrigos isolados da sociedade e sem muita interação, era a padrão. A muitos era negado o acesso à educação regular ou a qualquer outro tipo.

As melhorias a partir de então foram o resultado de leis progressistas tais como o Ato da Educação para Todas as Crianças Deficientes (EAHCA)², de 1975  e o Ato da Melhoria da Educação de Indivíduos com Deficiência (IDEA)³, de 1990 e ampliada em 2004. Ambas as leis tornaram o processo de ensino e aprendizagem de pessoas com deficiências um direito e foram um passo em direção ao ensino igualitário.

EAHCA foi a primeira grande lei que garantiu o direito à educação pública para todas as crianças com idade entre 5 e 21 anos. A EAHCA exigia que estudantes com deficiência recebessem educação pública, o que significava que os educandos eram colocados em escolas públicas, mas geralmente em salas de aula separadas. Essa política não encorajou um ambiente de inclusão, mas apenas uma educação pública e gratuita (EPG4). Diversas pessoas perceberam a necessidade de uma educação mais inclusiva que não fosse mandatária pela EAHCA.

Em 1990, mudanças foram feitas na EAHCA que estenderam a EPG para o Ambiente Menos Restritivo (AMR), exigindo que crianças com deficiências fossem educadas com crianças sem deficiências na medida máxima adequada. “Ambiente menos restritivo” significa que um estudante que tem uma deficiência deve ter a oportunidade de aprender com colegas sem deficiências, na maior extensão possível.

Esse ato incluiu disposições que exigiam que os estudantes com deficiência tivessem acesso ao currículo de educação geral, por meio de planos de ensino individualizado (PEI5). Para determinar o ambiente apropriado para um aluno, uma equipe analisaria as suas necessidades e interesses e escreveria um PEI6. Neste plano, os professores eram solicitados a desenvolverem os objetivos de aprendizado para estudantes com deficiência e as instituições de ensino destinadas a assegurarem que estes alunos os apreendessem. Com diferenças nas necessidades e interesses dos alunos com deficiência, não havia uma definição única do que um AMR seria para todos. Quando o AMR foi incluído na legislação, o EAHCA foi renomeado Ato da Educação de Pessoas com Deficiência (IDEA).

Muitas escolas nos Estados Unidos se moveram em direção da inclusão, mas não a implementaram com sucesso. Adrienne Asch7, um educador da Escola Wellesly, escreveu sobre muitos alunos com deficiência e as experiências deles no sistema público de ensino. De acordo com Asch , “aqueles (estudantes com dificuldades) em classes normais se veem em melhores condições do que os estudantes com dificuldades segregados, mas eles se sentem com frequência em desvantagem comparados com os colegas de classes sem dificuldades”. Como implementar da melhor forma a inclusão para contemplar, com sucesso, os educandos com dificuldades na classe de aula comum?

A Escola de Inclusão Henderson ofereceu um modelo para as outras escolas de inclusão seguirem. Desde que fez seu compromisso com tais práticas, há quase duas décadas, a escola tornou-se líder de inovação, colaboração e grandes expectativas para os estudantes com deficiência.

A Escola localizava-se em Dorchester, um grande bairro proletário de Boston, Massachusetts, e atendia um grupo de estudantes etnicamente, linguisticamente e racialmente diversificado. Era uma escola de ensino fundamental que ia do ensino infantil até o quinto ano (idades entre 5 e 12 anos), com 230 estudantes, 21 educadores titulados, 11 assistentes juntamente com muitos terapeutas ocupacionais e especialistas. Aproximadamente 33% eram estudantes com deficiência, muitas das quais eram rotuladas como significativas. O dia escolar ia das 9h25 da manhã às 3h15 da tarde. A Escola Henderson era uma escola de alto desempenho, com base em resultados de provas do sistema público de ensino de Boston.

Nos últimos dez anos, a Escola Henderson foi procurada8 para o ensino fundamental no sistema de escola pública de Boston por seu desempenho no MCAS9, uma prova estadual padronizada que todos os estudantes do ensino fundamental eram obrigados a fazer. Henderson tinha uma alta taxa de aprovação (veja Anexo 1), comparada com a média do estado para escolas públicas, especialmente em uma escola onde mais de 30% do corpo discente tinha uma deficiência diagnosticada.

Havia dois professores titulados em toda sala. Na sala de 4º ano da Srta. Bennett, ela e sua parceira de ensino, Srta. Foster, eram tituladas em educação especial e ensino fundamental geral. A Srta. Bennett tinha também especialização no ensino de inglês como segunda língua. Além delas, a sala ainda contava com um assistente individual que trabalhava em tempo integral com uma estudante que, por causa da intensidade de suas necessidades, precisava de apoio e instrução individuais. A Srta. Bennett e a Srta. Foster tinham estudantes com os seguintes perfis em sua sala:

  • Estudante A – déficits globais (atraso em geral em todos os aspectos do desenvolvimento), agenesia do corpo caloso (uma parte do cérebro subdesenvolvida), defeito séptico ventricular (problema no coração), e tetraplegia espasmódica (paralisia)
  • Estudante B – Síndrome de Down e déficits cognitivos
  • Estudante C – déficit de atenção/hiperatividade, tipo combinado (DDA e TDAH), transtorno de integração sensorial e deficiência de aprendizado baseado em linguagem.
  • Estudante D – transtorno de comportamento emocional e transtorno de comunicação expressiva
  • Estudante E – Síndrome de Asperger
  • Estudante G – distúrbio de disnomia (dificuldades em recuperar a palavra correta da memória)

Times de dois educadores se mostravam efetivos em uma sala inclusiva. Quando um estudante estava tendo um dia difícil e precisava de atenção extra, um podia dar o apoio necessário a este, enquanto o outro continuava trabalhando com os demais. Ambos eram proativos e capazes de atender a todos os estudantes.

A Escola Henderson era conhecida por promover altos padrões de ensino para todos os estudantes. A conversa cotidiana na escola era centrada no que é sucesso e o que significa ser bem sucedido. “É muito menos sobre a deficiência específica e bem mais sobre a criança individualmente.” disse a Srta. Bennett. Sucesso e realização eram celebrados de forma não tradicionais, como incentivar a autoestima crescente e ensinar os estudantes a serem solidários e cooperativos uns com os outros.

Além do alto rendimento acadêmico, a Escola Henderson tinha relativamente poucos encaminhamentos disciplinares. Esse era um resultado de sua abordagem proativa para assegurar que os alunos aceitassem a diversidade.

A Escola Henderson incluía a deficiência como parte dos esforços gerais para a diversidade. “Aqui todo mundo é diferente. Todo mundo é único, de sua própria maneira. Isso me faz muito feliz porque essa é uma escola de inclusão e basicamente todo mundo é amigo de todo mundo” disse Briana Sapienza, aluna do 4º ano. Estudantes eram ensinados desde o ensino infantil que todas as crianças são diferentes. Patricia Lampron, a atual diretora, reiterou, “aqui, nós estamos ensinando às crianças que é normal ser diferente porque é normal ser diferente. Aqui os estudantes são forçados a aprender como trabalharem juntos para serem bem sucedidos.”

Tecnologia

Atender as necessidades dos estudantes de educação especial era um desafio constante para os professores. Essa modalidade requeria formação e havia profissionais na escola que tinham preparação e uma grande experiência ensinando a pessoas com deficiências específicas. Além do ensino e experiência, a maneira mais eficiente com que os professores da Escola Henderson forneciam assistência para estes estudantes era por meio do uso da tecnologia. “O bom da nossa escola é que gastamos muito dinheiro com tecnologia. Todo professor está totalmente compromissado com o uso do Design universal para aprendizagem (UDL)10”, disse a Srta. Bennett.

Com o UDL, os professores utilizavam formas múltiplas de apresentar a lição, envolvendo os estudantes com o material e permitindo várias formas deles expressarem o que aprenderam11. Os professores relatavam que a tecnologia era essencial ao UDL e ao trabalho que os professores faziam. Alguns dos programas que os professores usavam diariamente na Escola Henderson incluíam Microsoft Office (principalmente Word e PowerPoint), Kidbiz3000, First in Math, Writing with Simbols, IXL, Bookshare e Kurzweil.

Kurzweil é um leitor de textos e um recurso excelente para aqueles que tinham dificuldades na alfabetização, incluindo os indivíduos com dificuldades de aprendizagem, como dislexia e déficit de atenção, bem como aqueles que eram Aprendizes da Língua Inglesa (ALIs). É um programa de computador interativo que permitia que os estudantes se empenhassem no texto digital. Por meio desse programa, o computador lê o texto em voz alta (baixado da internet ou digitalizado) e fornece uma marcação visual para acompanhar as palavras, além de suas definições. Estudantes com dislexia frequentemente liam devagar e se concentravam tanto na fonética que esqueciam o que liam, tendo dificuldade de compreensão12. Ao ler o texto em voz alta para o educando disléxico, o programa permitia a ele compreender os trechos, entender e aprender da sua própria forma. Assim, ele tinha acesso ao currículo e ao conteúdo com o resto da classe.

Além do Kurzweil, a Escola Henderson vinha investindo em um programa de leitura chamado Achieve/Kidbiz 3000. Primeiro, cada estudante fazia uma pré-prova. Então, eles liam a mesma história não-ficcional no seu próprio nível de leitura. Isso permitia a todos os estudantes aprenderem o mesmo conteúdo, mas no nível de habilidade no qual eles eram capazes de trabalhar. De acordo com a Srta. Bennett, o Achieve/Kidbiz 3000 e o Kurzweil eram formas relativamente fáceis dos professores diferenciarem a instrução para os educandos.

Currículo

Todos os professores na Escola Henderson empregavam conceitos de design universal. O Dr. William Henderson, fundador da escola e ex-diretor, escreveu: “Não pode haver pretensão de ensinar a todos os estudantes de salas inclusivas utilizando exatamente os mesmos materiais curriculares e estratégias instrucionais. Essa ‘uma forma serve a todos’ não seria uma boa pedagogia, mesmo em classes homogêneas ou hierarquizadas13. Na Escola Henderson, onde há alunos trabalhando em níveis de ensino acima, ligeiramente abaixo e bem abaixo do padrão em todas as salas, uma abordagem única nunca foi uma opção”14.

A pedagogia foi projetada de um jeito que permitia uma orientação diferenciada. Todas as disciplinas eram ministradas utilizando aprendizagem baseada em atividades15, onde os professores utilizavam agrupamentos para permitir que as crianças aprendessem de forma independente por meio de atividades práticas. “Em matemática, nós poderíamos ensinar a um minigrupo uma lição sobre frações e então os estudantes irão se dividir em grupos menores, seja em grupos orientados por computadores ou por um professor, dependendo do seu nível de habilidade e do quanto eles precisam de uma instrução mais guiada” disse a Srta. Bennett. Alguns educandos brincavam com uma versão mais fácil do jogo da fração, mas eles estavam todos trabalhando com o mesmo conceito.

Era essencial o uso de flexibilizações para que estudantes com deficiência tivessem acesso ao currículo. Essas adaptações, como elementos visuais extras e tecnologia – por exemplo, ferramentas de leitura de texto para estudantes com dislexia ou tempo a mais para aprendizado de conteúdo – permitiam que a inclusão fosse bem sucedida. De acordo com Thomas Hehir, especialista em inclusão e professor da Escola de Graduação de Educação de Harvard, adaptações “minimizam o impacto da deficiência e maximizam as oportunidades para estas crianças participarem da educação geral em sua comunidade natural”16.

“Em geral, a instrução que é exigida para ensinar estudantes com deficiências é boa para todos os educandos”17. A classe se beneficiava da instrução dada no pequeno grupo de apoio e da instrução individual que alunos de educação especial podiam necessitar. Por exemplo, alguns estudantes com deficiências precisavam que conceitos fossem apresentados visualmente com figuras e gráficos. Já que as apresentações visuais eram necessárias para que estes aprendessem, o conteúdo era sempre apresentado na sala da Srta. Bennett usando as duas formas, o que era útil para os alunos de ensino regular também.

De forma a atender as necessidades únicas de cada aluno, a maioria dos professores da Henderson adotou um modelo de ensino em pequenos grupos/atividades, nos quais os estudantes se moviam pela sala de aula e participavam de diferentes atividades: livres, orientadas pelo professor ou diversas modalidades combinadas. Como resultado, todos os estudantes recebiam instruções em seus pequenos grupos (sete estudantes para um educador) em uma média de trinta minutos de cada bloco de lição de sessenta minutos.

Alguns estudantes, por causa de suas deficiências, poderiam requerer instrução extra de especialistas. No entanto, fornecer esse extra era um desafio para educadores e especialistas, uma vez que não era o ideal tirá-los das classes, pois eles poderiam perder atividades de conteúdo e sociais.

Para corrigir esse problema, terapeutas e especialistas na Escola Henderson faziam a maior parte do seu trabalho com estudantes na sala de aula, eliminando assim a necessidade de serviços fora da classe. No entanto, nem todos os serviços eram prestados apropriadamente lá. Por exemplo, aconselhamento para estudantes autistas e ensino de braile para os cegos precisavam ser realizados em um local mais privado. Embora os serviços na sala de aula fossem ideais para a maioria, também requeriam maior planejamento e colaboração tanto do professor quanto do especialista.

No começo do ano escolar, os educadores sentavam-se com os especialistas para olhar a lista de sala e coordenar o conteúdo com os serviços que os estudantes precisavam. Por exemplo, na sala da Srta. Bennett, se a fonoaudióloga estivesse trabalhando os objetivos de leitura, ela se certificaria de que os estudantes com necessidades de fala fossem atendidos durante o período de leitura na sala de aula.

A Srta. Bennett e a Srta. Foster montaram um trabalho de pequeno grupo para a hora da leitura permitindo que a fonoaudióloga fizesse seu trabalho. De forma relevante, o pequeno grupo de estudantes que necessitavam de serviços do especialista em leitura parecia idêntico aos demais grupos. O terapeuta era capaz de trabalhar com seus objetivos dentro do contexto em que a classe inteira estava fazendo. Esta configuração garantia que o conteúdo fosse apresentado para todos os estudantes durante esse tempo.

Prestar serviços aos estudantes era apenas um dos muitos exemplos em que era absolutamente necessário que os professores colaborassem e se comunicassem com especialistas e outros educadores. “Comunicação é a chave para assegurar que uma escola inclusiva funcione tranquilamente. Se você é o tipo de professor que gosta de conduzir sua sala de aula como uma ilha, separada do resto da escola, então inclusão não será o tipo de escola na qual você será bem sucedido” dizia a Srta. Bennett.

Os educadores estavam constantemente colaborando uns com os outros e também entre terapeutas/especialistas. Eles tinham uma equipe de professores pensando em sugestões sobre como ensinar melhor um estudante específico. Se um educador estivesse com um problema com uma determinada criança, ele iria buscar ideias e orientação com outros professores. A Srta. Bennett enfatizava que “é importante lembrar que quando se está ensinando uma criança com deficiência, você é parte de uma equipe que inclui terapeutas, administradores, pais/membros da família, todos os professores, e muitas vezes médicos. Todo mundo deve trabalhar junto”.

No começo do ano letivo, os educadores dedicavam tempo para ler arquivos de anos anteriores sobre todos os estudantes. “É muito menos sobre a deficiência específica e muito mais sobre a criança individualmente,” disse a Srta. Bennett. Por lei, os professores eram obrigados a fazer planos educacionais detalhados para seus estudantes com deficiências diagnosticadas, chamados planos educacionais individualizados (PEIs), que cobriam objetivos de aprendizado, aspectos de como o estudante aprende e responde à disciplina. Com os arquivos, os educadores aprendiam quais estratégias de ensino, planos de disciplina e rotinas e procedimentos funcionavam com seus novos alunos. Se você estivesse recebendo um novo estudante, com quem ninguém na escola havia trabalhado antes, eles dedicavam tempo conversando com os pais e especialistas para conhecer o educando antes da escola começar.

“A coisa mais difícil de se trabalhar na Escola Henderson é que todos os dias nós temos que pensar bastante em como cada estudante aprende e em como nós vamos ensinar aquela lição e adaptar de forma que todos sejam incluídos e aprendam ao máximo de acordo com a sua habilidade” disse a Srta. Bennett. De acordo com as educadoras, elas estavam sempre pensando estrategicamente em como os estudantes com diferentes habilidades poderiam funcionar na mesma sala de aula. “Todo dia eu estou aprendendo com o trabalho” ela disse. “Eu aprendo coisas diferentes sobre cada estudante todos os dias e, de forma subjacente, estou constantemente pensando em como vou melhorar a instrução com base naquela nova informação.”

De acordo com os professores e pais, os educadores na Escola Henderson trabalhavam incansavelmente. Ensinar nos Estados Unidos não é uma profissão de muito status e, portanto, não é bem paga. Muitos educadores na Escola Henderson gastavam horas extras corrigindo trabalhos, conversando com os pais, colaborando e pesquisando, sem remuneração. Desde o começo, o Dr. William Henderson escolheu professores que estivessem dispostos a trabalhar em uma escola que exigia que eles pensassem diligentemente sobre cada criança. Ele liderou a escola, os professores e os estudantes por meio do exemplo. Ele conheceu cada professor e estudante, e estava altamente envolvido nas atividades diárias da escola.

Para o futuro

A medida que este dia letivo do mês de junho chegava ao fim, a Srta. Bennett avaliava como o ano havia sido18 e ponderava quais melhorias poderiam ser feitas para o ano seguinte. Ela gastaria uma boa parte do verão pesquisando seus estudantes e lendo as anotações dos educadores anteriores. “Meu maior desafio esse ano será: como desenvolver o cronograma certo e a rotina, permitindo que meus alunos floresçam e prosperem?”, Bennet disse. Ela e sua professora parceira iam planejar rotinas e procedimentos para conduzir a turma de forma eficiente e capacitadora.

Existiam algumas áreas nas quais a escola estava buscando dar passos largos. Disciplina era a primeira delas. Na Escola de Inclusão Henderson, não havia um sistema amplo de controle de comportamento ou reforço de comportamento positivo. Muitos acreditavam que não se fornece um modelo de comportamento suficientemente adequado.

Naquele verão, todos os membros da equipe escolar leram um livro chamado One, Two, Three Magic, do Dr. Thomas Phelin, sobre estratégias positivas de disciplina. No outono, todos os professores se juntaram e arquitetaram o que eles poderiam fazer, como uma escola, sobre comportamento. Todo mundo fazia sua própria disciplina em sala de aula, e não havia coesão de toda a escola sobre a disciplina dos estudantes. Como poderia a Escola Henderson desenvolver uma política disciplinar que permitisse aos estudantes se expressarem, de uma forma que compreendessem suas diferentes necessidades, enquanto minimizavam comportamentos destrutivos ou inadequados?

Outro aspecto do ensino que os professores planejavam melhorar era diferenciar as instruções para os estudantes com altas habilidades e para ALIs. No ano seguinte, quase metade dos estudantes do ensino infantil que ingressariam seriam nativos da Língua Espanhola. A escola já formara uma força-tarefa de ALI para ajudar os professores a melhorarem estas aulas. Como poderia a liderança da escola se adaptar ao número crescente de Alunos de Língua Inglesa?

Inclusão é um ideal difícil de se alcançar. Uma escola deve ter recursos adequados, liderança forte, experiência de professores e especialistas presentes para fornecer uma boa educação para estudantes com deficiências. A Escola Henderson usava equipes de ensino, tecnologia e sistemas de comunicação de forma eficiente, juntamente com professores e especialistas, para viabilizar um modelo bem sucedido de educação inclusiva. Eles tinham a experiência, a paixão, a liderança e recursos críticos para fornecer um ensino de qualidade para todos os estudantes com diferentes habilidades.

Anexo 1 – Plano educacional individualizado

Baixe o modelo do PEI

Apêndice 1 – Estatísticas básicas da Escola Henderson

Na primavera de 1989, a Escola Henderson se tornou uma escola de inclusão. Salas de educação infantil até o 5º ano, com idades de cinco a doze anos eram oferecidas na escola.

Pontuações de testes oficiais padronizados (MCAS), dados de 2010:

Ano Disciplina Taxa de aprovação
3 Inglês (ELI)19 91%
3 Matemática 91%
4 Inglês (ELI) 85%
4 Matemática 88%
5 Inglês (ELI) 80%
5 Matemática 70%
5 Ciências 75%

Total de matrículas: 218
Educação regular: 69,2%
Educação especial: 30,7%

Total de 34 adultos na equipe. 24 educadores, 100% deles são credenciados no estado de Massachusetts. A relação de estudante-funcionário é de 1h10 com um tamanho médio de classe de 22.

Apêndice 2 – Estatísticas básicas das escolas públicas de Boston (EPB)

Há 134 escolas no EPB: 6 centros de aprendizagem infantil (Educação Infantil ao 1º ano), 53 escolas de ensino fundamental I ( infantil ao 5 º ano), 23 escolas de ensino fundamental I e II (Educação Infantil ao 8º ano), 10 escolas de ensino fundamental II (6º ao 8º ano), 2 escolas de fundamental II e ensino médio (6º ao 12º ano), 29 escolas de ensino médio (9º ao 12º ano), 1 escola do ensino fundamental ao médio (Educação Infantil ao 12º ano), 3 escolas de “exame”20 (7º ao 12º ano), 6 escolas de educação especial (Educação Infantil ao 12º ano), 1 programa alternativo (crianças em situação de risco) e 4 escolas de inclusão (3 de ensino fundamental e 1 de ensino médio).

Taxa média de aprovação de provas oficiais padronizadas (MCAS) comparada à média do Estado:

Ano Prova Escolas públicas de Boston Pontuações do Estado
3 Ler 37% 63%
3 Matemática 42% 65%
4 ELI 30% 54%
4 Matemática 8% 48%
21 22 23 24
5 ELI 40% 63%
5 Matemática 39% 55%
33 34 35 36
5 Ciências 21% 53%
6 ELI 44% 69%
6 Matemática 38% 59%
7 ELI 48% 72%
7 Matemática 28% 53%
8 ELI 59% 78%
8 Matemática 37% 51%
8 Ciências 10% 40%
10 ELI 60% 78%

O número de matrículas de estudantes em 2011 é 57.050 incluindo: 27.420 estudantes no Ensino Infantil até o 5º ano; 11.580 estudantes nos anos 6º a 8º; 18.050 estudantes nos anos 9º até 12º.

Estudantes com deficiências

Mais ou menos 10.950 estudantes de idades entre 3 e 21 com deficiências (19% do total de matrículas) estão matriculados em programas de educação especial nas escolas Públicas de Boston, incluindo:

  • 56% com necessidades especiais classificadas como leves a moderadas que gastam pelo menos 60% do dia letivo em salas de aula de educação geral;
  • 44% com necessidades especiais classificadas como severas que gastam pelo menos 60% do dia letivo em salas de aula “substancialmente separadas”;
  • 460 alunos estão matriculados em instituições fora da rede municipal (privadas), e 300 estudantes não-EPB recebem algum serviço de educação especial nas escolas EPB.

Os 8.035 cargos dos funcionários de 2010-2011 (dedicação exclusiva):

  • 4.220 educadores;
  • 2.251 outros funcionários de escola;
  • 6.471 funcionários de escola;
  • 1.564 equipe central.

Qualificação dos professores da EPB (Ano letivo de 2010):

  • 98,8% são licenciados em sua designação de ensino;
  • 96,2% das principais aulas são ensinadas por professores altamente qualificados.

Notas

¹ O lema da classe “o fracasso escolar não é uma opção” é para incutir nos alunos a crença que eles não devem desistir. A frustração é algo que todas as pessoas vivenciam, mas precisam superar: não desista e, no final, supere.

² Sigla em inglês para Education for All Handicapped Children Act.

³ Sigla em inglês para Individuals with Disabilities Education Improvement Act.

4 Cf Karger, J. (2006). What IDEA and NCLB suggest about curriculum access for students with Disabilities. (pp. 69 – 100). In Rose, D.H., Meyer, A., Hitchcock, C., & Center for Applied Special Technology (CAST). The universally designed classroom: Accessible curriculum and digital technologies Cambridge, MA: Harvard Education Press.

5 Veja um exemplo de PEI utilizado na Escola Henderson School no Anexo 1.

6 Hehir, T., & Gamm, S. (1999). Special education: From legalism to collaboration. In J. P. Heubert (Ed.), Law and school reform: Six strategies for promoting educational equity. New Haven: Yale University Press. pp. 205-243

7 Asch, A. (1989). Has the law made a difference? In D. Lipsky & A. Gartner (Eds.), Beyond separate education: Quality education for all (pp. 181-205). Baltimore: Paul H. Brookes. Quote in text taken from pg. 183.

8 No sistema de escola pública de Boston, as famílias podem entrar em um sorteio de uma escola que elas escolhem para seu estudante.

9 Sigla para Massachusetts Comprehensive Assessment System (Sistema de Avaliação Abrangente de Massachusetts).

10 Sigla em inglês para Universal Design for Learning.

11 Para mais informações sobre o UDL e lições de exemplos, veja o site da CAST (em inglês) http://www.cast.org/udl/index.html

12 Cf Kurzweil, http://www.kurzweiledu.com/default.html

13 Classes hierarquizadas (tracked classes) refere-se a uma forma de selecionar as turmas ao classificar os alunos a partir de seus desempenhos em anos anteriores [nota do tradutor].

14 Henderson, W. (2003). Inclusion at the O’Hearn. p. 4

15 Na aprendizagem baseada em atividades, os professores escolhem uma área de conteúdo e objetivos de ensino. Os professores montam grupos de atividades onde as crianças estarão em uma determinada atividade por um determinado período de tempo e, então, mudarão para uma atividade diferente. O professor supervisiona andando pela sala. Cada agrupamento opera separadamente, o que facilita para os estudantes selecionarem uma atividade.

16 Hehir, T. (2005). New directions in special education: Eliminating ableism in policy and practice. Cambridge, MA: Harvard Education Press. Quote in text taken from pg. 49.

17 Hehir, T. (2010). Week 8: Accessing the curriculum. Harvard University lecture slides: Implementing inclusive education.

18 O ano letivo escolar norte-americano começa no segundo semestre (agosto/setembro) e termina no final do primeiro semestre (junho/julho). Dessa forma, as férias escolares coincidem com o verão no hemisfério norte, que começa em final de junho e vai até final de setembro [nota do tradutor].

19 Ensino da Língua Inglesa [Nota do Tradutor]

20 Essas são escolas que exigem uma alta pontuação na prova para admissão.

Sobre a autora

Lara Malpass, mestre em educação pela Harvard University Graduate School of Education.

Esse caso foi desenvolvido a partir de depoimentos dos envolvidos. Os casos do DIVERSA têm como finalidade ser utilizados por mediadores, em cursos de formação continuada, como base para discussões. Não servem, portanto, como endosso, fonte de dados primários ou de práticas pedagógicas efetivas ou inefetivas.

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Comentário

  • Bom dia! fiquei muito interessada e feliz em saber como é evoluida a educação nesse país,Parabéns a todos que fazem parte dessa escola inclusiva.Espero que um dia o meu país o Brasil também, seja inclusivo como os EUA está sendo. Deus os abençoe!

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